Como Tu e como Eu – Conflitos e Colaboração nas Organizações

Como Tu e como Eu – Conflitos e Colaboração nas Organizações

Como Tu e como Eu – Conflitos e Colaboração nas Organizações

1170 680 Hugo Gonçalves

O ser humano deve desenvolver, para todos os seus conflitos, um método que rejeite a vingança, a agressão e a retaliação. A base para este tipo de método é o Amor

—  MARTIN LUTHER KING

O Jogo da soma não zero para a performance, colaboração e conflitos nas organizações

Numa época onde continuamos envolvidos em divergências e conflitos cada vez mais exacerbados, comecei a refletir sobre como no contexto profissional, muitas abordagens de desenvolvimento e performance das Pessoas e Organizações ainda estão focadas em “evitar”, “gerir” ou até mesmo “provocar” 😊 conflitos e não os vivenciar de forma aberta, transparente e verdadeira.

Falo de olhar para estes eventos como sendo pontos de vista e visões diferentes, relativamente uma determinada temática. E não sucumbir à tentação de entrar no campo da pessoalização e num jogo de soma zero (bom e mau, bem ou mal, ganhar ou perder).

As divergências e conflitos têm todo o potencial para serem considerados um jogo de soma não zero, onde os compromissos, consensos, adaptações são iterações de melhoria e não cedências, são ajustes e não capitulações.

Uma situação de soma não zero é aquela onde todos os participantes beneficiam, ou que é benéfica para um (ou alguns) e neutra para outro (ou outros), ou que implicam “perdas” pequenas e não significativas para um (ou alguns) participante(s) e ganhos relevantes para outro(s).

Por exemplo, se pararmos por um momento para segurar a porta aberta para alguém, não estaremos a perder nada, e a pessoa que vem a seguir pode estar a ser beneficiada de forma relevante – se for alguém carregado com sacos, ou que está com um bebé ao colo, ou que simplesmente recebe um gesto gentil num dia onde tudo está a correr mal. 😊

Expandamos este raciocínio para eventos como parar sempre na passadeira, dizer bom dia a amigos e conhecidos e, quem sabe, a desconhecidos 😊, deixar passar à frente uma grávida, pai ou mãe com crianças de colo, ou pessoas mais velhas, na fila do supermercado.

A vida está cheia de casos em que um ligeiro investimento/perda feito por uma pessoa pode resultar num impacto positivo para outra. As organizações, como bem sabes, fazem também parte da vida. 😊

Se alimentarmos um sistema de consideração mútua – um sistema de humanidade comum – este beneficia todos.

Se, no nosso contexto profissional, reconhecermos quais os cenários em que pequenas ações nossas podem fazer uma diferença positiva, temos o poder de transformar momentos da nossa vida profissional e organizacional em situações de soma não zero, e com isso tornar o dia de outras pessoas um pouco melhor.

Somos assim mais eficazes no nosso próprio trabalho individual e colaborativo e desenvolvemos um espírito de tribo e grupo, robusto e verdadeiro:

Potenciando assim a:

LIDERANÇA, ORGANIZAÇÕES E O JOGO DA SOMA (NÃO) ZERO

“Não é uma questão de ter o suficiente, amigo. É um jogo de soma zero: alguém ganha, alguém perde.” – Gordon Gekko, Wall Street

No clássico de Oliver Stone de 1987, Wall Street, o papel de Michael Douglas como Gordon Gekko, não só rendeu ao ator um Óscar pela sua performance, mas também criou um protótipo do excesso individual.

A citação acima retrata Gekko como alguém cujas motivações vão para além de um interesse próprio racional, criando a mentalidade de que, “para ter eu sucesso, os outros devem falhar e perder”.

Imagino que o pensamento de soma zero provavelmente surgiu como resposta defensiva a ambientes com recursos escassos. Preparando os indivíduos para potenciais conflitos pela conquista desses mesmos recursos.

Durante o desenvolvimento humano inicial, os ganhos acumulados por alguns (por exemplo, comida, status ou parceiros), muitas vezes significavam que outros perdiam. Tais ambientes provavelmente teriam oferecido uma vantagem seletiva para aqueles que viam as transações com outros – como concorrentes territoriais ou rivais sexuais – como ganhos ou derrotas.

Então agora, quando nos encontramos em ambientes dinâmicos e incertos – e que melhor exemplo para isso do que as organizações – ainda recorremos a algumas destas formas mais primitivas de processamento de informações e análise de contexto.

O grande problema é que usar este backup 😊 é super ineficaz para dimensões organizacionais como liderança, desenvolvimento dos colaboradores, trabalho colaborativo, foco e empatia no cliente, etc.


O texto seguinte é a minha descrição romanceada de histórias reais partilhadas sobre esta temática, por líderes, managers, team leaders:

“Lembro-me de quando liderava um projeto e me senti ameaçado por um membro da equipa que mostrou um forte potencial de liderança e/ou competência. Ou porque discordava das minhas opções ou decisões.

Em vez de alimentar o seu crescimento, vi-o como uma competição. Pensei que, para ele subir, eu teria de cair. Esta mentalidade não só impediu o meu crescimento, mas também asfixiou o potencial da minha equipa.

Com o tempo, com a orientação de mentores e autorreflexão, percebi que liderança não é sobre manter o poder, mas sobre capacitar os outros.

É sobre exercer a minha própria Autoliderança e manifestar as minhas necessidades e limites. Reconhecer os meus recursos e habilidades e as minhas oportunidades de melhoria. E não confundir divergências e feedback com avaliações sobre quem eu sou como Pessoa.”


O que é giro 😊 é que normalmente tudo isto tem por base não o ganho/resultado/sucesso, mas sim uma questão emocional/existencial. Tem a ver com a forma como nos vemos, como sentimos, das experiências que tivemos e do grau de Autoliderança que possuímos.

É reflexo da nossa inteligência emocional e de “partes de nós” que são gestoras e “cortinas de fumo” das questões que, lá no fundo, despoletam os nossos gatilhos para os conflitos. Mas já lá vamos 😊

 

COMO PENSAR E SENTIR A SOMA NÃO ZERO NAS ORGANIZAÇÕES


1. REFORMULAR O CONCEITO DE “GANHO”

Parte da razão pela qual tempos de crise podem-nos levar a pensar em termos de soma zero é que tais situações ativam instintos de sobrevivência, fazendo com que nos concentremos estritamente em ganhos de curto prazo.

Mas é importante compreender que esse pensamento pode realmente ser contraproducente para o nosso próprio bem-estar, porque é em tempos de crise que mais precisamos da ajuda dos outros. E de chegar a consensos.

Quando colaboramos com os outros, é provável que geremos sentimentos de reciprocidade, cujos resultados podem superar em muito os ganhos a curto prazo.


2. IDENTIFICAR AS INTERAÇÕES DE SOMA POSITIVA

Momentos de crise fazem-nos percecionar que os recursos, habilidades, competências – nossos, dos outros e meio ambiente que nos rodeia – são escassos, mesmo que não são. É por isso que, em tais situações, podemos começar a ver as transações com outros como soma zero.

É importante reconhecer que existem inúmeras oportunidades para interações de soma positiva com os outros.


Outras abordagens que também ajudam:

  • Adotar uma mentalidade de abundância, celebrando as conquistas dos outros, percebendo que o seu sucesso pode abrir caminho para o crescimento coletivo.
  • Promover a colaboração ao incentivar membros da equipa a compartilhar ideias e colaborar em projetos. Isto não só melhora o produto/serviço final, mas também cria confiança e camaradagem.
  • Investir no desenvolvimento e proporcionar oportunidades para que os membros da equipa de facto cresçam e desenvolvam suas habilidades.
  • Dar e receber feedback e feedforward. Isso pode fornecer informações valiosas sobre áreas de melhoria e também pode dissipar sentimentos de competição.
  • Praticar a autorreflexão, avaliando de forma regular as nossas aspirações, motivações, competências e receios profissionais.

CODA

Estou aqui eu a escrever bem e bonito sobre este tema, mas também tenho os meus dias. 😊

Seja em situações mais desafiantes devido a negociação de fees e honorários, ou discussão com clientes e/ou parceiros sobre qual a melhor abordagem de conteúdos e delivery dos projetos, conversas difíceis porque estou piurso com alguma “falta de respeito” percecionada, ou conversas difíceis porque não quero criar algum tipo de conflito ou mal-estar, estou também exposto a todas as variáveis, dimensões e desafios que tive oportunidade de partilhar contigo.

E existem situações onde, nem mesmo com tanta leitura, reflexões, journaling, meditação, yoga, corrida, pedir conselhos a amigos/colegas e mais o catano, consigo ser o melhor exemplo de tudo isto que aqui partilho. 😊

Mas acredito e confio que existe um caminho. Considero que a natureza fundamental destes desafios sobre os conflitos, jogos de win-loose e afins advém da nossa (in)capacidade de reconhecer, aceitar e gerir paradoxos e ambiguidades. E de definições completamente míopes e externalizadas do que realmente significa sucesso pessoal e profissional

Toda esta máquina de lavar profissional e organizacional (em modo centrifugação) 😊 em que vivemos incentiva o curto prazo. E estamos muito cansados e/ou distraídos para pensar além das escolhas binárias e óbvias.

Uma mentalidade de suficiência – fundada na premissa de um pensamento de soma positiva para todos – é a base de uma vida sustentável e de um trabalho com propósito.

Uma mentalidade de soma positiva significa voltar ao que significa ser totalmente humano no trabalho.

Um exercício bastante poderoso e ainda mais desafiante, é colocarmos em cima da mesa o pressuposto de que existe o que muitas filosofias mais contemplativas e espirituais denominam de Humanidade Comum, principalmente em situações de conflito ou divergência profissionais e organizacionais.

Porque basicamente, exceto para situações mais extremas, as pessoas que nos fazem cócegas emocionalmente e que nos deixam piursos 😊 são de alguma forma espelho de algo que ainda não encontrou a sua paz e integração, em nós mesmos.

Todos os seres humanos têm, no seu íntimo e essência, aspirações, desígnios, experiências e desafios muito, muito, mas mesmo muito semelhantes. 😊

Nas situações profissionais e organizacionais de conflito e divergências, quando os assuntos já deixam de ser relevantes e a conversas (verbais ou aquelas que mentalmente temos dentro de nós) já tomam o caminho da pessoalização, pode ser fixe tomares consciência que há uma Pessoa à tua frente.


Que possui um corpo e uma mente. Que tem sentimentos, emoções e pensamentos, assim como tu e eu.

Essa Pessoa de vez em quando fica triste, dececionada, irritada, magoada ou confusa. Experimenta na sua vida dor e sofrimento físico ou emocional, tal como tu e eu.

Essa Pessoa está em constante aprendizagem sobre si mesma e sobre a vida, quer ser mais tolerante e gentil com os outros. Quer aceitar da melhor forma aquilo que a vida lhe proporciona e estar aberta e confiante de que algo melhor irá chegar, assim como tu e eu.

Essa pessoa deseja sentir-se segura, saudável e amada. Deseja ser feliz, assim como tu e eu.


Quando conseguimos ver o outro através destas lentes da humanidade comum – há quem chame de bondade amorosa, compaixão, tonglen, metta, etc., estamos então preparados para reconhecer a verdade que existe nas temáticas de divergência e se os conflitos valem ou não a pena todo o desgaste emocional, físico, de stress etc.

Começamos a estar mais abertos, empáticos, disponíveis para encontrar uma solução ou compromisso. Pode continuar a fazer sentido sermos mais assertivos ou defensivos, mas não ficamos depois tanto tempo a ruminar, as coisas passam.

Normalmente associa-se conflitos a palavras como divergências, discussões, mau estar. Mas a Escuta Ativa, a Empatia, o Estar Presente e o Reformular são também comportamentos e atitudes que devem promover uma nova abordagem ao conflito.

Então, quem sabe se os conflitos e divergências não são um ponto de partida para reconhecermos, através dos outros, a nossa própria humanidade interna (com todas aquelas emoções, pensamentos, emoções, desafios e aprendizagens).

E temos assim, através deles, uma oportunidade de desenvolvimento e crescimento pessoal, sincronizado com uma nova forma de compreender, colaborar e construir algo em comum com os outros, em contexto organizacional.

Obrigado, Abraço e Fica Bem, H

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