“Vivemos com o que recebemos, mas marcamos a vida com o que damos.” Winston Churchill
Dar e Receber. Todos nós já ouvimos esta frase, quase sempre associada a questões pessoais ou de relacionamentos com outros. Mas cada vez mais o ato pro-activo de dar gera, nos negócios e economia actuais, recompensas materiais, intangíveis e existenciais. Ao encorajarmos os nossos colaboradores e associados a dar e procurar ajudar nos seus pares, líderes ou equipas, estamos a validar atitudes saudáveis, a filtrar comportamentos menos alinhados e a criar benefícios sustentáveis e duradouros. De que forma?
Setembro de 2011. Após os eventos desse dia, os serviço de inteligência norte-americanos foram “pacificamente” invadidos por um conjunto de especialistas em Psicologia da Universidade de Harvard. O objectivo era determinar de forma objetiva quais os factores críticos de sucesso das equipas de inteligência e análise. Através de um acompanhamento próximo de 64 equipas, através de entrevistas, observações in-loco e análise de desempenho, os investigadores criaram um ranking de eficácia|eficiência. Em seguida, os especialistas identificaram um conjunto de factores críticos que seriam os drivers para essa eficiência. Ao compilarem os dados e após detalhada análise, chegaram à conclusão que o factor diferenciador não estava nessa lista: nem estabilidade na equipa, nem um número adequado de pessoas, nem uma visão clara, nem responsabilidades e funções bem definidas.
Em vez desses, o factor que foi identificado como aquele que permitia antecipar e caracterizar uma equipa como tendo um alto potencial de eficácia (que depois na prática era efectivamente comprovado) foi a capacidade dos analistas e operacionais se ajudarem mutuamente. Nas equipas de maior performance, os seus elementos investiam grandes doses de tempo e energia em ensinar e consultar os seus pares. Esta abordagem permitia aos analistas colocarem em causa as suas próprias percepções, preencher os seus gaps de competências e reconhecer padrões mais complexos e interligados em bocados de informação aparentemente desconexos. Nas equipas com performance inferior, os analistas trabalhavam de forma quase individual, desligada de outros contextos.
A importância destes comportamentos help-driven não se esgota apenas em contextos mais complexos ou intangíveis. Philip Podsakoff, da Universidade do Indiana determinou de forma quantitativa que a frequência com que os colaboradores se ajudam uns aos outros tem impacto concreto e definido e permite calcular revenues de vendas nas indústrias farmacêuticas e de retalho, lucros, custos e serviço ao cliente na indústria bancária, produtividade e qualidade em empresas industriais e lucros, eficiência e satisfação do cliente em restaurantes e hotéis.
Em todos estes contextos, a organização beneficia quando os colaboradores partilham de forma pro-activa o seu conhecimento. Podsakoff identificou os seguintes benefícios com esta atitude de colaboração aberta:
- Colaboradores resolvem problemas e realizam as suas tarefas de forma mais eficaz e eficiente;
- Criação e consolidação de uma coesão e coordenação da equipa, que surge de forma natural;
- Experiência dos mais velhos é transferida para os mais novos;
- Redução da variabilidade da performance;
- Estabelecimento de um ambiente empresarial onde clientes e fornecedores e parceiros sentem que a organização leva em conta as suas necessidades e expectativas;
- O maior obstáculo a esta abordagem é a “cultura”. O desafio é “construir” a cultura certa. e só existem 2 hipóteses: a cultura do DAR ou a cultura do TIRAR:
Na cultura DAR, os colaboradores operam segundo uma matriz de colaboração e inovação aberta: ajudando os outros, partilhando conhecimento e trazendo à superfície ligações disruptivas sem esperar nada em troca. Na cultura TIRAR, a norma é receber o máximo da colaboração dos outros e partilhar o menos possível. Apenas se ajuda quando os benefícios superam o custo ou o incómodo de ajudar e partilhar.
A maior parte das organizações opera algures no meio destas duas realidades. Existe a abordagem de ajudar apenas quem nos ajuda, mantendo um equilíbrio entre o DAR e TIRAR. Os colaboradores trocam “favores” em circuito fechado, sendo que o impacto global para a organização devido a esta abordagem neutra é também ele neutro ou residual. Se precisar de uma visão diferente ou informações sobre uma determinada competência, estas só estão disponíveis se existir uma relação pessoal.
Então o que impede a implementação desta abordagem de partilha desinteressada? Normalmente, as estruturas interdepartamentais, organizadas por funções e não por cadeias de valor, são o maior obstáculo. De acordo com Robert Frank, economista na Universidade de Cornell, algumas organizações trabalham no registo “winners take all”, onde se promove o foco na competição por recompensas e e promoções. Promover uma concorrência interna agressiva na perspectiva de assim motivar as pessoas para obterem melhores resultados faz com que as pessoas se foquem nos seus interesses individuais e se preocupem em evitar serem prejudicados, em vez de trabalharem sob uma perspectiva mais pró-activa sobre como podem continuamente ajudar a empresa.
Como criar e sustentar uma cultura DAR? Liderança! Aos líderes comprometidos com a cultura de partilha e da organização como um todo está destinado o papel de facilitador das práticas definidas pelo professor Adam Grant, no seu livro “Give and Take”:
1| Criar uma cultura onde a dúvida e o medo de errar não existe:
A cultura DAR está dependente, obviamente, da abertura e conforto dos colaboradores em pedirem ajuda. Senão fica difícil saber quem precisa de ajuda e como ajudar. No entanto as pessoas, de forma natural têm alguma relutância em pedir ajudar, pensam que não vale a pena, que podem passar uma imagem de incompetência, menor valor profissional ou fragilidade. Uma forma de dar a volta a este contexto é criar, no ambiente de trabalho, um espaço e tempo para materializar esta abordagem. Em algumas empresas americanas já se implementam os “Colaboration Caffe’s”, eventos onde se criam grupos de 10-12 pessoas e cada um dos elementos faz um pedido de ajuda relativamente a uma questão profissional que pretende resolver ou melhorar. O conjunto das competências, recursos e networking dos restantes elementos do grupo fornecem a melhor solução possível, com o bónus de ser alinhada com outras funções e departamentos. 2 runs de eventos de 90 minutos (pessoal e profissional). Como todos estão no mesmo comprimento de onda, as pessoas raramente se sentem desconfortáveis em pedir ajuda. Que resultados esta abordagem pode proporcionar? Segundo os dados e feedback prestados pelos participantes destes eventos, sendo que os mesmo muitas vezes são realizados em formato inter-empresa, os ganhos são relevantes: poupanças médias de 50.000€ por participação. Um conjunto de 30 elementos de uma organização que lançou um evento interno deste género apontaram ganhos estimados em 200.000€ e poupança de 1.244 horas. Para além dos ganhos, estes eventos criam uma consciência colectiva sobre as dificuldades e desafios que os colegas enfrentam no dia-a-dia.
Para tudo tem que existir um ponto de equilíbrio. A partir de uma abordagem correta como esta da implementação da cultura DAR, não podemos extrapolar para um cenário onde os colaboradores estão apenas focados na ajuda aos outros. Deixará de existir tempo e energia para que os colaboradores possam executuar as suas prórias tarefas e actividades. O que vai acontecer é que a equipa ou vai aceitar que o seu trabalho seja prejudicado ou vão voltar ao modo TIRAR. Os lideres têm que delimitar as “fronteiras”, janelas de colaboração, horários de atendimento onde a interrupção é possível e outras alturas onde as pessoas possam estar efectivamente dedicadas e concentradas no seu trabalho. Outra abordagem que faz todo o sentido é capitalizar a experiência e o know-how das organizações através da criação da figura de mentor|tutor. Esta função tem um papel de suporte na análise e resolução de problemas concretos e por outro lado permite o desenvolvimento inside-out das competências relacionais e sobre como de facto materializar com actos e coerência o papel de líder.
2| Recompensas: “A virtude está em premiar o esforço que não vise prémio.”
Num mundo perfeito, os líderes poderiam promover culturas DAR apenas recompensando os seus colaborares pela sua atitude e obviamente resultados. Várias pesquisas e experiências comparativas relativas a resultados obtidos com recompensas cooperativas (€ para equipa) ou competitivas (€ para indíviduo) provaram de forma objectiva que equipas “alimentadas” a € são eficientes mas não eficazes e que mesmo após uma transição para um sistema de recompensas mais colaborativo, os resultados se mantêm ou até caem.
A cultura DAR está assente em algo mais do que o reconhecimento e recompensa. Existe um conjunto de intangíveis que necessitam de estar sempre presentes. Cabo ao líder, mais uma vez ser um facilitador. Um comunicador. Escutar de forma activa e ajudar os colaboradores a colocarem em causa as atitudes e desafios que os impedem de agir segundo padrões de confiança e partilha. Um caso extraordinário de criatividade na criação de um sistema de recompensas baseado de forma equilibrada nos € e reconhecimento emocional foi o projecto implementado por Cory Ondrejka, CTO do Linden Lab (a empresa que criou e gere o Second Life). A empresa desenvolveu e patrocinou um sistema de gorjetas. Por cada ajuda prestada, um colaborador era recompensado com um valor até 3€. A métrica financeira é associada a uma métrica emocional, que é a reputação, também era gerida e visualizada num portal interno. Assim era partilhada para toda a organização o estado do comportamento colaborativo da organização
Os dados recolhidos evidenciam a importância de se contextualizar as recompensas e criar incentivos que sejam distribuídos de forma espontânea e sem criar grande ruído. Por exemplo, cada pessoa possui créditos os quais utiliza de forma discricionária para valorizar a ajuda que recebeu dos colegas. Ao suportar este tipo de abordagens, a gestão de topo reconhece e valoriza o acto de DAR nos Negócios.
3| Percorra o caminho
As culturas empresariais do DAR, apesar de poderosas, estão assentes em pilares muito dinâmicos e com uma tecnologia bastante complexa: As Pessoas. Para manter esta estrutura, cabe aos líderes embarcarem com o mesmo entusiasmo e altruísmo que é pedido aos restantes colaboradores nesta aventura.
Para finalizar, uma pequena história que reflecte a essência das ideias partilhadas neste artigo:
Em 1985 uma produtora cinematográfica que passava por bastantes dificuldades financeiras contratou um novo CEO. Num esforço destinado a reduzir de forma rápida e drástica os custos, o novo presidente pediu a dois directores de divisão, Ed e Alvy, para iniciarem um processo de layoffs. Estes resistiram argumentando que o maior valor da empresa eram as pessoas, a sua paixão e a sua criatividade e que não fazia sentido recuperar uma empresa dispenando o seu maior activo e vantagem competitiva. O CEO não foi sensível a estes argumentos e fez um ultimato. Nos próximos dois dias teria que ter uma lista com o nome das pessoas a dispensar. Quando recebeu essa lista, estavam lá apenas dois nomes; Ed e Alvy
Mais tarde, Steve Jobs comprou as divisões geridas por Ed e Alvy e juntamente com eles criou a Pixar.
Os colaboradores estavam contentes e bastante gratos pelo facto de os seus líderes terem colocados os seus próprios empregos em causa para o bem comum da equipa e da empresa.
O exemplo é sempre a mensagem mais poderosa. Se deseja algo, seja o primeiro a dar o que deseja aos outros.
Abraço,
Hugo Gonçalves