Métis (Parte 1)

Métis (Parte 1)

900 598 Hugo Gonçalves

Não é possível com uma mente mortal indagar os pensamentos dos deuses.

Píndaro

MÉTIS – O Oráculo Oculto de Profissionais e Organizações

Há algumas semanas estava a vaguear numa FNAC (sim, vaguear é o verbo mais adequado para mim quando vou a uma FNAC ?) quando num dos escaparates dos livros estava um nome que me chamou à atenção – David Brooks.

Fiquei logo entusiasmado, qual puto que descobre um novo brinquedo, porque um dos melhores livros que tenho em casa é deste autor – O Caminho Para o Caráter. 

Então peguei no livro, com o nome de “O Animal Social” e reparei que era uma reedição. Os textos já têm alguns anos (2012) mas ao folhear e “conversar” com o livro ? – abrir as páginas ao calhas, ver o índice, sentir o papel e olhar para o grau de user experience do tamanho e tipo de letra, nem pensei e sem explorar mais, comprei o livro.

Foi a minha intuição + uma experiência anterior agradável + mais um processo lógico de identificar interesse e “comida” para a minha auto-atualização que levaram a essa compra (atent@ a esta frase que vai ser muito relevante mais à frente) ?

Pois bem, o David partilha através da história de duas personagens, como é que evoluímos emocional, mental e espiritualmente e que tipo de impactos isso traz na nossa vida pessoal, relacionamentos de todo o tipo e trabalho. 

Amor, Caráter, Felicidade, Consciência, Agir ou Aceitar/Ir Embora são questões exploradas através do acompanhar de vida destes dois “personas”, polvilhado com partilhas científicas, filosóficas e existenciais do autor e de outras fontes. 

Em resposta ao que designa por cultura do «Grande Eu», que enfatiza o sucesso exterior, Brooks desafia-nos (e a si mesmo) a tentar reequilibrar as nossas “virtudes de currículo” – a obtenção de riqueza, fama e estatuto – face às “virtudes de ser”, que se encontram no âmago do nosso ser – bondade, coragem, honestidade ou fidelidade ao verdadeiro e importante – centrando-nos no tipo de relações que desenvolvemos.

Com esta ótima deixa, cabe-me a mim agora explanar (em duas partes), como estas virtudes de Ser se alinham com o que os profissionais e organizações necessitam para proporcionar respostas, impactos e soluções às Pessoas e Mundo. ?

// UM POUCO DE HISTÓRIA

O Iluminismo francês foi liderado por pensadores como Descartes, Rousseau, Voltaire e Condorcet. 


Foram filósofos que confrontaram um mundo de superstição e procuraram expô-lo à luz clarificadora da razão. Inspirados pela revolução científica, tinham grande fé no poder da razão individual para detectar erros e chegar logicamente à verdade universal.

Entretanto havia um Iluminismo diferente, numas ilhas ali perto de França, que se desenvolvia aproximadamente no mesmo momento. 

Os líderes do Iluminismo britânico reconheciam a importância da razão. Contudo, acreditavam que a razão individual é limitada e de importância secundária. 

“A razão é e deve ser apenas a escrava das paixões e emoções, e jamais pode pretender qualquer outro ofício que não o de servi-las e obedecê-las”, escreveu David Hume. Parece-me muito catita e concordo plenamente! ?

Enquanto os líderes do Iluminismo francês falavam a língua da lógica, da ciência e das regras universais, os líderes do Iluminismo inglês enfatizaram o poder dos sentimentos e das afeições

Os filhos do Iluminismo francês tendem a ver a sociedade e suas instituições como máquinas a serem desmembradas e reorganizadas, os filhos do Iluminismo britânico tendem a vê-las como organismos, redes infinitamente complexas de relações de convivência

De facto, os membros do Iluminismo britânico baseavam sua visão da natureza humana na ideia de que o comportamento é amplamente moldado pelo inconsciente, pela denominada cognição de Nível 1 ou inconsciente.

// SOMOS UM ORÁCULO OCULTO

Os processos conscientes são acomodados sobre processos inconscientes

Não faz sentido falar sobre pensamento racional sem pensamento inconsciente, porque o Nível 2 (consciente) recebe os seus estímulos, seus objetivos e sinais de foco do Nível 1.

Os dois sistemas têm de se entrelaçar para que a Pessoa prospere.

O Nível 1 quer sistemas vastos e implícitos de memória, experiências e sabedoria “ancestral” dos quais possa se alimentar, ao passo que o Nível 2 se debruça profundamente no sistema da memória de trabalho, os pedaços de informação que estão conscientemente na mente em qualquer dado momento. 

Processos conscientes são melhores em resolver problemas com poucas variáveis ou escolhas, problemas quando os fatores são definidos de forma concreta.

Processos inconscientes são melhores em resolver problemas com muitas possibilidades e variáveis e quando tudo é ambíguo.Adivinha o que é que estes tempos líquidos e os nossos amigos VUCA e BANI estão a pedir. ? Hahahahahhaha

1 Pessoa, 2 Sistemas 🙂

Como líderes, managers, profissionais, cabe-nos encontrar a nossa ?Modéstia Epistemológica.

É o conhecimento de quão pouco sabemos ou podemos saber. A modéstia epistemológica é uma atitude em relação à vida e trabalho. 

Essa atitude é construída com base na noção de que não nos conhecemos. A maior parte do que pensamos e acreditamos está indisponível à revisão consciente. 

Somos o nosso próprio maior mistério.

Toda a Evolução advém da Exploração e Feedback, de vaguear e de repousar e absorver e processar tudo o que aconteceu no percurso. Para isso, precisamos dos Outros e os outros também contam Contigo! 

Pois, sendo incapazes de entender os outros completamente, também não conseguimos chegar de verdade ao fundo das circunstâncias. 

Ao leres as palavras Humildade e a Modéstia, quando enquadradas no contexto profissional e organizacional, podes estar eventualmente a fazer caretas e/ou a sentir respostas emocionais de perceção de fraqueza, vulnerabilidade ou passividade. ?

Acontece exatamente o contrário! ?

A modéstia epistemológica é uma disposição para a ação. As pessoas com essa disposição acreditam que a sabedoria começa com a consciência de sua própria ignorância e procuram agir, aprender, explorar.

É um reconhecimento de que não há um único método para resolver problemas. É importante contar com a análise quantitativa e racional. Mas isso fornece parte da verdade, não a verdade inteira. 

E para a verdade completa, precisamos de Métis.

// MÉTIS

Métis é difícil de colocar em palavras. Uma pessoa com Métis possui um mapa mental de sua realidade em particular. E uma visão de helicóptero do que a rodeia e como esses vários mundos se interligam e impactam mutuamente. 

Adquiriu um grupo de habilidades práticas e sensibilidade que lhe permite prever/sentir mudanças. Ela reconhece o contexto geral de uma situação, mas também as propriedades particulares da mesma.

Uma pessoa com Métis sabe quando aplicar o procedimento, mas também reconhece quando deve flexibilizar as regras. 

Segundo o filósofo Isaiah Berlin (disclamer – é algo denso ?):

Nós, humanos, vivemos a vida no meio de um fluxo específico de eventos, o meio no qual estamos. Não absorvemos e não conseguimos absorver [esse fluxo] como se viesse de fora; não conseguimos identificar, medir e tentar manipular; não conseguimos nem ter total consciência dele, visto que entra intimamente em toda a nossa experiência.

No entanto, apesar de não conseguirmos analisar o meio sem um ponto de vista (impossível) fora dele (pois não há “fora”), ainda assim alguns seres humanos estão mais cientes — apesar de não conseguirem descrever isso — da textura e da direção dessas porções “submersas” de sua própria vida e da dos outros.

Mais cientes disso do que outros, que ou ignoram a existência de um meio que permeia tudo (o “fluxo da vida”) e são chamados de superficiais, com razão; ou tentam aplicar-lhe instrumentos — científicos, metafísicos etc. — adaptados unicamente para objetos acima da superfície, a porção relativamente consciente e manipulável de nossa experiência.”

// O MÉTISVERSO

A sabedoria que talvez possa ser decisiva nestes tempos para os profissionais e organizações será uma habilidade de ser guiado por curiosidade, intuição, emoções e factos — a “sabedoria imemorial” que dizem residir em camponeses e outros “povos simples” — nas quais regras da ciência não se aplicam em princípio.

Ao rever o texto deste artigo, fico feliz e leve. Porque de alguma forma vi plasmadas nas partilhas do David Brooks alguma Métis em algumas coisas que em mim e na minha vida consigo manifestar (em outras dimensões continua a confusão ?).

Porque (atenção aos links ?):

?PROFISSIONAIS KNOWMAD

?ENGENHARIA ORGANIZACIONAL

?720º

?AUTOLIDERANÇA EVOLUTIVA

?SENSEMAKING E CTRL+ALT+DEL

?TRABALHAR, LIDERAR, GERIR…. DEVAGAR

encaixam muito bem na riqueza e acessibilidade de todos as competências técnicas, emocionais e relacionais para podermos dar uma resposta eficaz a todos estes vulcões. 

São dimensões, possibilidades, abordagens, ferramentas de Métis!

Para um Mundo Líquido, são necessárias Explorações, Interpretações, Imaginações, Planeamentos e Execuções Líquidas e que metamorfoseiam-se consoante o contexto. São necessários Exploradores, enfim, Knowmads! ?

Um Knowmad é um profissional que, tendo um eixo específico e definido de atuação, vagueia ao nível do conhecimento, experiências, inovação e do inesperado. 

É alguém criativo, altamente inteligente a nível emocional, que se dá bem em contextos de individualidade e de trabalho em equipa e que adota uma plasticidade genuína que lhe permite trabalhar com toda a gente, a qualquer altura e em qualquer lugar. 

Procura obter conhecimento não só através da pesquisa e leitura, mas também das conversas, viagens, formações e da sua capacidade de sonhar

Encontra palcos onde pode experimentar e iterar as suas novas ideias, para permitir uma melhor definição e apresentação das mesmas a um mundo mais “convencional” das organizações e negócios. 

Por fim, consegue materializar o famoso “cabeça no ar com os pés no chão”, através de uma constante reconfiguração e recontextualização dos temas, atividades, resultados e relações profissionais.

Na segunda parte deste artigo vou apresentar como a Métis pode ser identificada, desenvolvida e materializada de forma individual e em equipa, nos nossos processos de consciência, transformação e ação profissionais e organizacionais.

Apenas posso revelar que, da forma como vejo as coisas, procuro um Caminho para um tipo diferente de Conhecimento = Sabedoria + Intuição + Partilha.

Que nasce dos atos de integrar e de sintetizar dinâmicas diversas. 

Que é produzido ao longo do tempo por uma inteligência que é associativa — observando com atenção, imaginando livremente, comparando probabilidades com improbabilidades e probabilidades com histórico, para encontrar harmonias e ritmos adequados para aquilo que as Pessoas e Mundo precisam e desejam.

Obrigado, Abraço e Cuida-te,

Hugo

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