VUCA, BANI e TETRIS
Um dia Kurt Vonnegut, autor do polémico “Matadouro Cinco” e Joseph Heller, autor do magistral “Catch 22”, livro que serviu de inspiração a um dos primeiros artigos do Knowmad Blog, estavam a conversar numa festa, num bairro fino de Nova Iorque.
Sendo o anfitrião e a festa enfadonhos, os dois amigos começaram então a espicaçarem-se um ao outro com provocações. A certa altura, Vonnegut vira-se para Heller e diz-lhe:
“Sabes que o nosso anfitrião ganhou mais dinheiro ontem do que tu com o teu romance desde que chegou às livrarias?”
“Aí sim?”, diz Heller? “Pois eu tenho algo que ele nunca terá!”, sorriu misteriosamente.
“Que raio? Exatamente o quê?” perguntou um Vonnegut verdadeiramente intrigado.
“A noção e clareza de que eu tenho o Suficiente!”
Boooommm! Grande Heller. ?
Esta história sempre me fascinou, quer pelas aspirações que ela desenvolve em mim como Pessoa, quer pelos meus conflitos internos entre a palavra SUFICIENTE e parte mental e do ego.
A minha resistência não era com a ideia de vida que esta palavra representava, no contexto da história do Vonnegut e do Heller. Era com o significado normalmente atribuído à palavra, como se fosse uma etiqueta de semi sucesso, realização pela metade ou algo parecido.
Mas finalmente encontrei o FIT entre as minhas aspirações e a palavra ou expressão:
Suficiente = Adequado. Na Dose Certa. É a Abundância customizada a Mim.
Já ia lançado a fazer a ligação desta história com o famoso VUCA quando tropecei num artigo sobre outro acrónimo. Ainda bem, porque até eu próprio, que sou fã do conceito, já estava a enjoar um pouco. ?
O VUCA é baseado em trends, economia, negócios e não em Pessoas, Emoções, Evolução e Transformação. É um acrónimo definidor do Agora, mas algo manco sobre os cenários futuros.
Nos últimos anos o VUCA – Volatile, Uncertain, Complex & Ambiguous serviu de ponto de orientação para as abordagens Agile, de Inovação Aberta e Self-Oriented Teams no trabalho, na forma de pensar e criar, e na interpretação do mundo em geral.
BANI
Mas estes tempos líquidos tiraram o tapete ao nosso amigo VUCA, ainda mesmo antes de ele ficar fora de moda ?:
- O que dantes era volátil passou a ser Frágil;
- As pessoas não sentem incerteza, sentem Ansiedade;
- O mundo já não é complexo, é cada vez mais caótico, insondável e Não-Linear;
- O que dantes era ambíguo, hoje é manifestamente Incompreensível.
Surge daí o BANI (já o tinha referido ao de leve no artigo anterior a este e aqui vai o desenvolvimento):
BRITTLE | FRÁGIL
Sistemas frágeis são suscetíveis a falhas repentinas e catastróficas. Ao contrário de serem resilientes, eles são quebradiços. Os nossos sistemas são frágeis neste momento. Ponto! As coisas podem funcionar bem à superfície, mas os seus pilares podem estar a se desfazer de forma invisível.
ANXIOUS | ANSIOSO
Hoje, a ansiedade está no nível mais alto de todos os tempos, e isso também não é uma novidade. Se as pessoas estão constantemente ansiosas, então as sensações de impotência ou a dificuldade em tomar decisões serão também constantes.
Num mundo ansioso, as pessoas ficam à espera do próximo Armageddon ou desastre. Sentem-se passivas e evitam decisões pelo receio de falhar. Sentem frustração e ressentimento por oportunidades que passaram. Em muitos casos sentem o dilema de “deixarem” a outros o papel de tomada de decisões e criação de um espaço seguro, quando não se sentem capaz de o fazer por si próprias.
NON LINEAR | NÃO-LINEAR
Estudiosos e tecnólogos falam sobre crescimento ou mudança exponencial, mas num sistema não-linear, a causa e o efeito estão aparentemente desconectados, e por isso não há uma mudança exponencial. É simplesmente Caótica. Os seres humanos hoje, em termos técnicos, perderam a habilidade de planear e prever. O ecossistema não permite.
Pequenas decisões têm impactos desproporcionados, que podem ser benéficos ou simplesmente devastadores. As mudanças iniciadas no agora só daqui a uns (longos) tempos irão proporcionar resultados tangíveis. Dar o máximo e fazer muito pode não dar origem aos melhores resultados e em alguns casos até pode criar mais disrupção.
INCOMPREHENSIBLE | INCOMPREENSÍVEL
Estar vivo no século XXI é confiar em inúmeros sistemas complexos e incompreensíveis que afetam profundamente as nossas vidas. Todas estas não linearidades dão origem a eventos, acontecimentos, e até mesmo decisões que não têm logica nenhuma. Mais informação e dados trazem mais ruído e ambiguidades, mas a nossa capacidade de interpretar o mundo não consegue filtrar e limpar esses ruídos. Por isso, os dados poderão em alguns casos esmagar a nossa capacidade de compreender a realidade, usar o bom senso e confiar na nossa intuição.
UM POSSÍVEL CAMINHO…
Apesar de parecer mais catastrófico que o VUCA, eu acredito que o BANI é mais realista, concreto, verdadeiro e que nos dá pistas para podermos de facto observar o que nos rodeia e decidirmos qual o melhor caminho a tomar… por agora.
O BANI é sobre a Verdade das Pessoas e Coisas, aponta um foco para as nossas vulnerabilidades, para a ideia que temos do “mundo que criamos” e redefine novos critérios para o que quer que signifique sucesso.
O BANI permite:
- Fazer sentido deste mundo e dos outros que vêm aí;
- Mais rapidamente identificar as interligações entre os efeitos (o que está a acontecer) e as causas (porquê + caos que levou a esses efeitos);
- Para podermos, em vez de estruturas rígidas como andaimes para observar o mundo, criarmos outros pontos de observação (de bambu por exemplo ?) para de forma segura e flexível observarmos o nosso ecossistema e inclinarmo-nos para cuscar o que está a acontecer naqueles que estão à nossa volta.
Como disse anteriormente, este “referencial” está mais focado nas Pessoas e na forma como nós funcionamos a nível mental, relacional e emocional. O BANI proporciona de forma clara quais poderão ser as estratégias que nos poderão ajudar a surfar o mundo:
Se algo está frágil, necessita de robustez e resiliência;
Se nos sentimos ansiosos, necessitamos de empatia e mindfulness;
Se algo é não-linear, está mesmo a pedir foco no contexto, adaptabilidade e aceitação;
Se algo é incompreensível, a resposta passa pela transparência, verdade e intuição.
E para isto, é necessário [re]aprender a jogar TETRIS. ?
Onde o jogo passa por alcançar a melhor e mais rápida combinação de “formas” para podermos avançar de nível.
Mas eu também imagino que existe num dos lados do ecrã do jogo, um poço sem fundo onde irão cair as peças que não consigas utilizar (porque aparecem muito rápido) ou porque elas não encaixam com o que os teus contextos, cenários, pessoas, organização, produtos, serviços realmente necessitam na “janela” do Agora.
CONSCIÊNCIA, TRANSFORMAÇÃO, AÇÃO
Seres um Líder e Profissional que domina este novo jogo do TETRIS e do BANI implica sincronizaresHEAD, HEART e HANDS:
- HEAD trata de imaginar o futuro, explorar o presente e ecossistemas, definir prioridades e alinhar as competências e talentos próprios e dos outros para se trilhar o melhor caminho;
- HEART é sobre sentirmos a firmeza, vontade, energia para aceitarmos “enfrentar” da melhor forma possível os desafios e aproveitar entusiasticamente as oportunidades;
- HANDS anima o dar forma, o executar, iterar com foco e agilidade simultâneos.
Este 3H (Head, Heart, Hands), que vi pela primeira vez num trabalho de pesquisa da BCG, pressupõe uma abordagem:
Deliberada e formal – para garantir que todos os intervenientes estão no mesmo comprimento de onda;
Equilibrada – para que se possa dar a importância adequada a cada elemento, contexto, estímulo e decisão;
Disciplinada – porque transformar hábitos e emoções “antigas” em outras mais reais e contemporâneas demora o seu tempo;
Integrada – para que os talentos, processos, know-how e criatividade das pessoas não sejam barricadas em departamentos organizacionais, mas sim utilizadas de forma holística, desenhadas à medida, fomentando a sua interligação e reforço mútuos.
Cabe-nos a nós criar uma tela onde estejam representadas a realidade e a visão positiva das coisas da forma mais concreta possível.
E isto passa por trazer clareza à nossa mente, aceitação para as nossas emoções e foco para a nossa energia de ação. Desde ponto de partida certamente surgem aspetos positivos, oportunidades, novas aspirações e potencial para ser transformado em performance, metas e resultados. o BANI é apenas um ponto de partida.
Para se materializarem estas coisas todas num registo de Liderança, Gestão e Organizações, continuo a afirmar que uma mescla do Coaching, Design Thinking e Abordagem Agile poderá ser perfeitamente…
Adequado, Suficiente, a Dose Certa. A Abundância customizada em Ti!?
Eu chamo a essa mescla a ENGENHARIA ORGANIZACIONAL.
Obrigado, Abraço e Cuida-te